domingo, 10 de agosto de 2014

Lágrimas: Processos Individuais

          O momento histórico em que vivemos não abre espaços para as vivências de dor. A todo o momento a felicidade é cultuada e a tristeza guardada a sete chaves no fundo do porão; tentamos passar o mais longe possível de tudo o que possa nos fazer sofrer. Grita-se aos ventos o quão feliz somos: será que convencendo aos outros, estamos tentando convencer a nós mesmos?
            O trabalho de se estar sempre em um dos polos da vida, na felicidade ou na tristeza, vai nos tornando cada vez mais rígidos e petrificados, como se não houvesse mais, ou como se não pudesse haver mais, espaço para o outro oposto. Como se pessoas muito tristes e deprimidas não tivesse mais espaço no coração para gotinhas de felicidade. Ou como se pessoas felizes, alegres e contentes não pudessem perder tempo chorando suas chateações.
Diz-se que o verdadeiro princípio de nosso trabalho como terapeuta é de dissolver a pedra, tornando mais fluidos e leves os processos individuais. Isso por que corpos dissolvidos assumem a natureza de espíritos, ou seja, com a “dissolução” do corpo, presenciamos a coagulação do espírito.
Como agente de dissolução, pensamos na água. E como parte do processo analítico, a “água” que é produzida dentro do consultório do analista, as lágrimas.
Segundo Capriotti (2008), o choro pode ter dois sentidos, a dissolução de resistências e de couraças rígidas, quando podemos nos demonstrar fluidos ou a dissolução de tudo sob a forma de lágrima, quando nos encharcamos e nos submergimos. Há o choro que lava, purifica e fertiliza, o choro que traz renascimento.
No choro vamos elaborando as nossas questões íntimas. Muitas vezes o chorar é ruim e amargo e uma vez que estamos tratando da dissolução de certezas. Porém, muitas vezes sentimos prazer no choro, dizemos “saí de alma lavada”. E saiu mesmo! As lágrimas tem a função de limpeza dos olhos, mas tem também a função de limpeza da alma (CAPRIOTTI, 2008).
Ainda segundo a mesma autora, citando Lutz (1999) nos traz: “não é que nossas emoções, sem encontrar saída na ação, são reduzidas a lágrimas, mas sim que certas emoções encontram sua saída perfeita nas lágrimas”.

 Aqueles que choram são os mais corajosos e bravos, aceitaram o desafio de encarar a vida como ela de fato é, cheia de alegrias, mas também de tristezas. Encararam seu processo individual, transformando seus muros em rios passageiros. 

CAPRIOTTI, L. Multiplicidade de Lágrimas: o choro e suas diferentes nuances. Cadernos Junguianos, São Paulo, n. 4, 2008.