quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Tornando sua casa um lar: Encontro com o mito da deusa Héstia.

Héstia (conhecida como Vesta na mitologia Romana), é filha primogênita de Réia e Crono. Segundo a mitologia grega, Crono engoliu seus filhos por medo de ser superado por eles, Héstia foi a primeira a entrar nas entranhas do pai e a ultima a sair, permaneceu na escuridão e nas opressivas vísceras de Crono, sendo a única a ficar lá sozinha.
É difícil dizer que Héstia teve uma infância feliz. Com o pai tirano e a mãe ineficaz e sem poder, ela foi forte para lutar e vencer com os meios que podia. Mulheres tipo Héstia passam por situações parecidas, sendo criadas em lares conflituosos. É provável, contudo, que filhas do tipo Héstia, se retraiam emocionalmente e se retirem para seu próprio intimo, confortando a si mesma em meio a uma vida familiar penosa. Pode agir de modo diferente de toda a família, ela tenta não ser notada e tem uma passividade exterior e um sentimento interior que com certeza é diferente daqueles que a cercam. É discreta em todas as situações e cultiva a solidão mesmo quando em grupo.
Essa é a deusa da lareira, do fogo que queima na lareira. É representada pela chama viva dentro do lar, do templo e da cidade. Sua personalidade é de natureza subjetiva e interior (bem diferente de suas irmãs, Ártemis e Atena, que colocam a energia para fora, realizando coisas). Seu trabalho e ocupação são, quase sempre dentro de casa, cuidando do lar; não por que a obrigaram para que fosse assim, mas por que ela prefere e se sente mais completa desta maneira.
As mulheres que estão sendo influenciadas pelo arquétipo da deusa adquirem um sentimento de harmonia interior conforme executam as tarefas domésticas, realizando-as de modo calmo e pacífico, com pouca preocupação com o tempo. Ela faz as tarefas do lar, pois estas realmente lhe importam e porque lhe agrada fazê-las. Sente-se bem interiormente quando as finaliza.
Ela vive porém, no anonimato. Aceita ser modesta, seu trabalho por ser no lar, não é valorizado por todos e frequentemente seus sentimentos não são levados em consideração. Muitos casamentos bem sucedidos se dão com homens tipo Hermes, aquele homem de negócios-viajante-transmissor-empresário, agilmente negociando no mercado, enquanto sua esposa mantém aceso o fogo do lar. E muitas vezes esse arranjo funciona para ambos. Ela gosta da autonomia para decidir o que será feito no lar e o amparo econômico que ele lhe dá permite tempo e espaço para fazer o que lhe importa. Porém, se esse amparo não existe, Héstia ficará em desvantagem, não tem ambição e nem é movida por causas políticas. Ela não está pelo mundo afora deixando pegadas, e nem se preocupa com isso. Deste modo, ela não é notada ou é desvalorizada pelos que não conseguem medir os atributos “socialmente aceitos” externos, e nesta vão achar que ela não os possui.
Claro que, para vivermos de modo mais inteiriço, todas as deusas nos deveriam visitar. As características mais valorizadas e esperadas para se viver hoje, não são características da deusa em questão: empreendedorismo, espírito de equipe, agilidade nos negócios, habilidade de relacionamento, etc. Mas me parece que ela tem seu lado interno bastante equilibrado, sendo uma em si mesma, sentindo-se realizada pelo trabalho que desempenha, tendo espírito autônomo e reflexivo.
Penso que todas as mulheres deveriam ser visitadas por Héstia mais vezes; essa deusa é um “ponto tranquilo” em meio a agitação que passamos no dia a dia. Héstia fornece o ponto de referência que permite a mulher permanecer firme diante da confusão, desordem ou afobação, com ela a vida adquire um significado. Héstia não liga para posses, prestígio ou poder, sente-se completa como é e dá importância interna as atividades do lar que gosta de realizar. Imagine se pudermos nos “desintoxicar” das lutas por ser o primeiro ou o mais bem sucedido e pudéssemos simplesmente nos ligar aquilo que tem um significado individual em nós, sem gastar energia e preocupação com o que os outros vão pensar ou achar?
Para fazer isso, precisamos convidar Héstia a tomar parte das tarefas diárias da casa, ou seja, depois de decidir qual tarefa fazer, dedicar tempo para ela. Por exemplo, dedicar-se as tarefas domésticas é tarefa exaustiva demais para algumas de nós, porém se adotar o modo de fazer da deusa, a mulher pode dar boas-vindas à oportunidade de dobrar roupas, lavar louça, decorar enquanto esvazia e aquieta sua mente.

Obter um espaço meditativo dentro de seu próprio lar é um presente que Héstia nos proporciona. Apropriar-se de sua casa. De seu lar. De seu meio. De sua vida. 



Referência: Bolen, J. S. As Deusas e a Mulher: nova psicologia das mulheres. São Paulo: Paulus, 1990.