segunda-feira, 18 de julho de 2016

Apaixonamento e amor real: A vida depois do "foram felizes para sempre"

           Lembro-me de quando era pequena e comecei a fase das muitas perguntas e muitos porquês, perguntei a meu pai o motivo pelo qual maioria das musicas que ouvia na rádio falava sobre o amor, a paixão, o relacionamento entre casais. As crianças, apesar de serem inocentes, prestam muita atenção a sua volta e desconsertam os adultos com perguntas sagazes. Meu pai riu e me explicou que era porque esse sentimento era o mais difícil de se entender e também o mais bonito de todos. Por hora a resposta me satisfez. A questão é que cresci e pude também vivenciar tal sentimento, mais tarde me formei Psicóloga e gostaria de dividir com vocês alguns pensamentos acerca deste tema.
            Há muitas coisas a se dizer sobre o apaixonar-se. Quem nunca passou por isso, certamente tem a experiência da vida um pouco mais empobrecida. É um sentimento único, que nos proporciona emoções inesperadas e fortes, que encontram vazão na companhia da pessoa escolhida. “Ter a experiência de apaixonar-se equivale a tornar-se aberto aos assuntos do coração de maneira maravilhosa. Pode ser o prelúdio de uma expansão valiosa da personalidade e da vida emocional. É também uma experiência importante porque aproxima os sexos e inicia o relacionamento.” (Stanford, p.27).
            Acontece que os relacionamentos que se baseiam apenas na paixão nunca duram. E isso acontece por que quando o casal é submetido a prova de fogo da realidade a união não resiste. Na paixão o que acontece é que ficamos encantados com a imagem que a pessoa causa em nós e não na pessoa real. Projetamos naquele ser humano todas as imagens maravilhosas e mágicas existentes em nós, nos esquecendo que aquela pessoa é uma pessoa real, com imperfeições humanas. A paixão resiste apenas no mundo da fantasia, é digno de deuses e não de seres humanos. Quanto mais reais vão se tornando um para o outro, menor é a possibilidade de imagens fantásticas provenientes do inconsciente continuarem a ser projetadas sobre o outro e dai o estado de apaixonamento se esvai e dá lugar ao relacionamento real.
            Tal ideia não nos agrada, pelo menos não nos dias de hoje, que coloca esse estado de apaixonamento como meta de todo e qualquer relacionamento. Temos que admitir que não somos muito inteligentes em matéria de filtrar o que consumimos através da televisão e redes sociais. Muitos de nós acabam optando por continuar procurando o homem ou a mulher ideal e a garantia que de ele ou ela fará nos sentirmos felizes e realizados.
            Sanford (1987), resume:
Quando nos apaixonamos por alguém que não conhecemos como pessoa, mas por quem somos atraídos porque reflete para nós a imagem do deus ou da deusa em nossas almas, é, num certo sentido, apaixonarmo-nos por nós mesmos, apaixonar-se cada um por si mesmo, e não pela outra pessoa. Não obstante a aparente beleza das fantasias de amor que costumamos ter nesse estado de apaixonados, podemos, de fato, encontrar-nos num estado de espírito profundamente egoísta. O amor real começa somente quando uma pessoa chega a conhecer a outra, para quem ele ou ela é realmente um ser humano, e quando começa a amar esse ser humano e a preocupar-se com ele.

Crescemos acreditando que o príncipe viria num cavalo branco e nos faria feliz para sempre. Ou os homens, que ao dar um beijo na donzela adormecida a faria cair de amores por ele instantaneamente. A história do conto de fadas continua... O que será que aconteceu com o príncipe quando ele envelheceu? Ficou com barriguinha de cerveja, cabelos brancos, dor nas costas? A a princesa, será que teve filhos e assim reclamou das noites mal dormidas e acordou com olheiras, não deu tempo de secar o cabelo e ficou cheio de frizz?
Ser capaz de um amor real significa amadurecer e se responsabilizar pelas próprias felicidades e infelicidades, sem esperar que venha um outro nos fazer feliz ou triste, não culpa-lo pelas más indisposições ou frustrações. É claro que relacionamentos não são fáceis, mas nos responsabilizarmos como seres humanos adultos pelas nossas emoções é um caminho pelo qual a capacidade de amar amadurece.



Referências
Sanford, J. A., Os Parceiros Invisíveis. São Paulo: Paulus, 1987.