Lembro-me
de quando era pequena e comecei a fase das muitas perguntas e muitos porquês,
perguntei a meu pai o motivo pelo qual maioria das musicas que ouvia na rádio
falava sobre o amor, a paixão, o relacionamento entre casais. As crianças,
apesar de serem inocentes, prestam muita atenção a sua volta e desconsertam os
adultos com perguntas sagazes. Meu pai riu e me explicou que era porque esse
sentimento era o mais difícil de se entender e também o mais bonito de todos. Por
hora a resposta me satisfez. A questão é que cresci e pude também vivenciar tal
sentimento, mais tarde me formei Psicóloga e gostaria de dividir com vocês
alguns pensamentos acerca deste tema.
Há muitas coisas a se dizer sobre o
apaixonar-se. Quem nunca passou por isso, certamente tem a experiência da vida
um pouco mais empobrecida. É um sentimento único, que nos proporciona emoções
inesperadas e fortes, que encontram vazão na companhia da pessoa escolhida.
“Ter a experiência de apaixonar-se equivale a tornar-se aberto aos assuntos do
coração de maneira maravilhosa. Pode ser o prelúdio de uma expansão valiosa da
personalidade e da vida emocional. É também uma experiência importante porque
aproxima os sexos e inicia o relacionamento.” (Stanford, p.27).
Acontece que os relacionamentos que
se baseiam apenas na paixão nunca duram. E isso acontece por que quando o casal
é submetido a prova de fogo da realidade a união não resiste. Na paixão o que
acontece é que ficamos encantados com a imagem que a pessoa causa em nós e não
na pessoa real. Projetamos naquele ser humano todas as imagens maravilhosas e
mágicas existentes em nós, nos esquecendo que aquela pessoa é uma pessoa real,
com imperfeições humanas. A paixão resiste apenas no mundo da fantasia, é digno
de deuses e não de seres humanos. Quanto mais reais vão se tornando um para o
outro, menor é a possibilidade de imagens fantásticas provenientes do
inconsciente continuarem a ser projetadas sobre o outro e dai o estado de
apaixonamento se esvai e dá lugar ao relacionamento real.
Tal ideia não nos agrada, pelo menos
não nos dias de hoje, que coloca esse estado de apaixonamento como meta
de todo e qualquer relacionamento. Temos que admitir que não somos muito
inteligentes em matéria de filtrar o que consumimos através da televisão e
redes sociais. Muitos de nós acabam optando por continuar procurando o homem ou
a mulher ideal e a garantia que de ele ou ela fará nos sentirmos felizes e
realizados.
Sanford (1987), resume:
Quando nos apaixonamos por alguém que não conhecemos como
pessoa, mas por quem somos atraídos porque reflete para nós a imagem do deus ou
da deusa em nossas almas, é, num certo sentido, apaixonarmo-nos por nós mesmos,
apaixonar-se cada um por si mesmo, e não pela outra pessoa. Não obstante a
aparente beleza das fantasias de amor que costumamos ter nesse estado de
apaixonados, podemos, de fato, encontrar-nos num estado de espírito
profundamente egoísta. O amor real começa somente quando uma pessoa chega a
conhecer a outra, para quem ele ou ela é realmente um ser humano, e quando
começa a amar esse ser humano e a preocupar-se com ele.
Crescemos
acreditando que o príncipe viria num cavalo branco e nos faria feliz para
sempre. Ou os homens, que ao dar um beijo na donzela adormecida a faria cair de
amores por ele instantaneamente. A história do conto de fadas continua... O que
será que aconteceu com o príncipe quando ele envelheceu? Ficou com barriguinha
de cerveja, cabelos brancos, dor nas costas? A a princesa, será que teve filhos
e assim reclamou das noites mal dormidas e acordou com olheiras, não deu tempo
de secar o cabelo e ficou cheio de frizz?
Ser
capaz de um amor real significa amadurecer e se responsabilizar pelas próprias
felicidades e infelicidades, sem esperar que venha um outro nos fazer feliz ou
triste, não culpa-lo pelas más indisposições ou frustrações. É claro que
relacionamentos não são fáceis, mas nos responsabilizarmos como seres humanos
adultos pelas nossas emoções é um caminho pelo qual a capacidade de amar
amadurece.
Referências
Sanford, J. A., Os Parceiros Invisíveis. São Paulo: Paulus, 1987.