Em uma cultura consumista como a nossa ansiamos pelo
imediatismo. Tudo é para agora e para já. Não temos mais paciência para esperar
que a fruta caia do pé, que a criança demore a falar, que seu amigo não
responda prontamente sua mensagem, que seja respeitado o limite de velocidade nas
estradas. Ah, e queremos garantias também, “sua satisfação ou seu dinheiro de
volta”, sem riscos, sem achismos, só a certeza de que no fim, seu contentamento
será completo.
Inseridos
nessa cultura afobada estamos nós; seres humanos que vivem o depois se
esquecendo do agora. O mesmo que acontece fora, está acontecendo internamente,
estamos em plena comunicação com o todo, afinal, é difícil estar no mundo sem
fazer parte dele. Vivemos o futuro: crises de ansiedade estão mais comuns do
que nunca.
Ficamos
ansiosos, preocupados e ocupados o tempo todo. Não sei o que quero, mas quero
hoje. Essa linguagem fica desorganizada e fora de contexto quando falamos de
nós, dos nossos sentimentos e de como digerimos nossas emoções e nossas
relações. A exatidão dos feitos não vale e não tem a mesma forma, nem a mesma
precisão das percepções de alma.
Bauman
(2004), fazendo um recorte do tempo atual e das relações amorosas, diz:
A promessa de aprender a arte de amar é a
oferta (falsa, enganosa, mas que se deseja ardentemente que seja verdadeira) de
construir a ‘experiência amorosa’ à semelhança de outras mercadorias, que
fascinam e seduzem exibindo todas essas características e prometem desejo sem
ansiedade, esforço sem suor e resultados sem esforços.
O autor
fala da dificuldade em se relacionar nos tempos modernos, o encontro amoroso
não acontece seguindo a lógica atual. “Onde há dois não há certeza”, ele diz.
Essa falta de certeza pode enlouquecer alguns, já que não podemos esquecer que
o amor tem algo de sua origem no impulso antropofágico, o desejo de incorporar,
possuir, grudar e ser dono do outro é primitivo e dá aos amantes a falsa
sensação de que se eu me fundir ao outro, eu elimino a angústia da
separação/insegurança.
Na
parceria conjugal o outro é um segundo plenamente diferente e independente de
nós. Com ele vêm novos questionamentos, nova história de vida, novos padrões e
novos parâmetros. Recebemos um convite de adoração insegura do outro, este é
soberano e não uma extensão, eco, ferramenta ou empregado trabalhando para mim.
A incerteza precisa ser reconhecida e aceita. Ainda segundo Bauman, “Ser duplo
significa consentir em indeterminar o futuro”.
E o
quanto estamos prontos para isso? O quanto é difícil abrir mão desse conforto
(ainda que por vezes ilusório) de estar sempre no poder?
A
relação amorosa é algo tão especial que além de externamente nos perceber em
parceria, nos coloca em contato com um mundo bem diferente daquele que citamos
no começo desde escrito, um mundo mais humano, mais falível, mais natural.
(...)
Amar significa manter a resposta pendente ou evitar fazer a pergunta.
Transformar um outro num alguém definido significa tornar indefinido o futuro.
Significa concordar com a indefinibilidade do futuro. Concordar com uma vida
vivida, da concepção ao desaparecimento, no único local reservado aos seres
humanos: aquela vaga extensão entre a finitude de seus feitos e a
infinibilidade de seus objetivos e consequências.
“Navegar
é preciso, viver não é preciso”, Fernando Pessoa consegue traduzir muito bem a
finitude e a exatidão que a vida e também os encontros amorosos não nos traz.
Talvez seja essa a procura de deveríamos nos debruçar, quando eu me liberto da procura
lógica ou veloz do viver é que eu consigo estar em harmonia e em paz comigo
mesmo.
Referências:
BAUMAN, Z. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004.