Estudando o arquétipo da deusa Hera na
psicologia das mulheres, me deparei com o seguinte pensamento: É cobrança da
sociedade andarmos apenas aos pares ou as pessoas só podem realmente ser
completas quando encontram a sua “cara-metade”?
Sabemos que nas gerações passadas, em uma
cultura predominantemente patriarcal, o que era esperado de uma mulher era a de
que ela se casasse e tivesse filhos o mais cedo quanto fosse possível. Essa era
a sua principal ocupação. Casamento, ser uma boa esposa e cuidar de seu marido.
Parir, ter filhos saudáveis, capazes de trabalhar e terem filhos no futuro. E o
mais interessante, mesmo dentro de um casamento que não a satisfazia, ela não
via outro caminho. Talvez a dor da crítica social fosse mais dolorida do que
permanecer num lugar onde já não mais cabia. Não ser esposa aos até 30 anos,
era sinônimo de que a mulher não havia cumprido seu papel, e por isso era
vazia, perdia seu valor. A mulher Hera recebia então o maior apoio, pois o
desejo interno de ser esposa encontrava lugar externo e era exatamente o que
esperavam que ela fizesse. Esse é o chamado de Hera, de ser companheira, fiel e
leal até o fim com seu marido e isso a faz forte e completa. O feminino
visitado por essa deusa encontrava seu lugar.
Nos anos atuais, mudamos um pouco em relação
aos lugares que as mulheres ocupam e querem ocupar. A sociedade ainda é
patriarcal, mas não podemos negar que perdeu um pouco de sua força. Temos
direito a várias coisas e podemos escolher o lugar que queremos ocupar, seja de
esposa, de mãe, de profissional. O caminho que antes era traçado para nós e
imposto passa a ser uma escolha mais branda e mais personalizada.
É permitido escolher vários caminhos. Casar
ou não. Ter filhos ou não. Casar-se aos 25 ou aos 45. Viver sozinha, ou acompanhada.
Escolher seu parceiro ou parceira pelo amor e não pela posição de sua família.
Claro que para alguns certas escolhas são vistas com olhos julgadores, mas as
mulheres estão mais fortes e mais seguras para lidar com tais atitudes. Porém
podem sentir-se pressionadas pelas expectativas culturais de se estabeleceram e
se casarem.
Inevitavelmente são alvos de perguntas do
tipo:
“Que
bom, você tem um ótimo emprego, mas quando vai se casar?”
“Foi
promovida? Que notícia boa, e o marido quando vai vir?”
“Seu
casamento foi lindo, vai encomendar bebês?”
“Esse
peru de natal está delicioso, mas e os namoradinhos?”
Conseguimos
respeitar uma mulher que vive bem só ou ela só é vista quando tem um homem ao
seu lado? Defendo a idéia de que a escolha de ter alguém a acompanhando seja
dela, que seja uma escolha própria e mais consciente possível.
Hera vem
para nos mostrar que é possível ser feliz no casamento, e que casar pode ser o
desejo mais genuíno e verdadeiro da pessoa. Mas e se não for? Se ela decidir
esperar mais um pouco, ou simplesmente seguir a jornada da vida desacompanhada
de namorados/maridos/afins? Ela estará incompleta ou pelo contrario, será sua
forma mais completa possível, enchendo-se aquilo que é essência?
O
sentimento de completude só vem acompanhado de decisões verdadeiramente
internas.
“Sua
visão se tornará clara somente quando você olhar para dentro do seu coração.”
(C. G. Jung)
Referência: Bolen, J. S. As Deusas e a Mulher: nova psicologia das mulheres. São Paulo: Paulus, 1990.